quarta-feira, 20 de julho de 2011

Breve histórico da epigenética

Olá,
Inicio com esse texto abaixo a publicação de textos de autores convidados aqui no blog. A primeira convidada é a Catarina F. Lira-Medeiros, pesquisadora do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. O convite para Catarina se deu pelo seu trabalho com a plasticidade fenotípica em plantas. Espero que vocês curtam e comentem!



A plasticidade fenotípica é a capacidade de um organismo ou grupo de organismos de se adaptarem às alterações ambientais. Nas plantas, que são sésseis, a plasticidade é um recurso muito importante para a sobrevivência de indivíduos ou populações principalmente nos dias atuais em que alterações ambientais, provocadas principalmente pelo Homem, ocorrem de forma desenfreada. Acredita-se que a plasticidade fenotípica esteja muito ligada às alterações epigenéticas do DNA, principalmente quando os indivíduos possuem pouca variação genética entre eles. Epigenética é o estudo das mudanças produzidas na expressão gênica causadas por outros mecanismos que não as mudanças na seqüência de bases do DNA, daí o nome do epi-(grego: επί-over, acima) -genética.

Em 1905, o geneticista britânico, Wiliam Bateson (1861-1926) cunhou o termo da genética como o termo relacionado à hereditariedade e variação dos organismos, baseado nos trabalhos de Gregor Mendel (1822-1884). Três décadas depois (1942), o geneticista, biólogo e filósofo Conrad Hal Waddington (1905-1975) definiu "epigenética" como "o ramo da biologia que estuda as interações causais entre genes e seus produtos, que trazem o fenótipo a ser". Quando Waddington cunhou o termo paisagem epigenética (“epigenetic landscape”), a natureza física dos genes e seu papel na hereditariedade não era conhecido, ele usou-a como um modelo conceitual de como os genes podem interagir com o ambiente para produzir um fenótipo. E demonstrou que as idéias de herança apresentadas por Jean-Baptiste Lamarck (1744-1829) poderiam, pelo menos em princípio, ocorrer. Dois posts anteriores são interessantes para aprofundar nas teorias de Waddington, que incluem a canalização e a assimilação genética. Todas esta teorias foram fundamentadas nos estudos de Lamarck sobre assimilação de caracteres adquiridos por informação ambiental (aqui os links para os dois posts 1 e 2)

Robin Holliday (nascido em 1932, nessa foto ai do lado) definiu epigenética como "o estudo dos mecanismos de controle temporal e espacial da atividade dos genes durante o desenvolvimento de organismos complexos". Assim, a epigenética pode ser usada para descrever qualquer coisa, que não cause alteração de seqüência de DNA, e que influencie o desenvolvimento de um organismo. Em 1975, foi proposto por Robin Holliday, junto com seu estudante John Pugh, e independentemente por Arthur Riggs, que a metilação do DNA podia ser um importante mecanismo para o controle da expressão gênica em organismos superiores. O DNA contém quatro unidades de informação: adenina, guanina, citosina e timina, conhecidas coletivamente como bases, e abreviado para A, G, C e T (veja a figura aqui em baixo, na esquerda). Mas uma quinta base é produzida através de alteração química, que é a metil-citosina (veja a figura abaixo, na direita). Holliday acreditava que a citosina metilada ou metil-citosina podia ter um papel importante no controle da atividade do gene. Também foi proposto que o padrão de citosina metilada poderia ser herdado através de divisões celulares. Na época não haviam evidências diretas sobre este controle da expressão gênica via metilação de citosinas e hoje isso tornou-se documentado como um mecanismo básico da epigenética para o silenciamento de genes.

Atualmente além da metilação de DNA, a modificação de histonas por acetilação ou metilação e os pequenos RNAs regulatórios são também considerados alterações epigenéticas. Os mecanismos que controlam a metilação do DNA e seus efeitos sobre os fenótipos têm sido investigados em plantas modelo, mas o seu impacto sobre a evolução de populações naturais é pouco explorado. Organismos interagem entre si e com seu ambiente abiótico, e através dessas interações adquirem informação epigenética, algumas das quais são herdadas. Ao contrário da variação genética, as mudanças epigenéticas, que geram fenótipos novos e herdáveis, podem representar alterações genômicas reversíveis que permitem colonizar ambientes variáveis e novas paisagens durante um processo evolutivo a longo prazo.


Para maiores detalhes:
Holliday R. (2006) Epigenetics A Historical Overview. Epigenetics 1:2, 76-80. (esse artigo vocês conseguem de graça aqui)

Jablonka E. & Lamb M.J. (2002) The Changing Concept of Epigenetics. Ann. N.Y. Acad. Sci. 981: 82–96). (e este também de graça aqui)